sábado, 3 de abril de 2010

Como era de se esperar.

9 e 32 da manhã. O banco abre às 10 e eu já estou na fila. Eu e muita gente. Só me dei conta que era o último dia útil antes do feriado prolongado quando cheguei lá. Tarde demais para voltar. Quando cheguei já havia muita gente, e muito mais viria. Todas extremamente preocupadas, com cara de poucos amigos e devidamente apressadas. Como era de se esperar.

Atrás de mim estava uma senhora simpática, daquelas velhinhas simpáticas que a gente vê nos filmes de cinema. Aparentava preocupação. Não essas preocupações cotidianas, pagar as contas, entregar o trabalho no prazo, arrumar o carro, lavar a roupa, consertar a torneira da pia da cozinha... Preocupava-se com algo que transcendia. Talvez a idade avançada traga outro tipo de coisas para se preocupar. Para os mais místicos, o que acontece depois da morte. Para os religiosos a salvação. Para os que têm filhos, o que será deles. Para ela, a vida. A vida que vivera, os caminhos que percorrera e as escolhas que fizera até aquele momento. Esse era o meu palpite. Seus olhos traduziam o cansaço de uma vida inteira. Olhava fixamente para um ponto qualquer no chão do banco lotado, com a postura de uma...

- Sem vergonha! Moleque mal educado! Respeita...

Pessoas extremamente preocupadas, com cara de poucos amigos e devidamente apressadas. Como era de se esperar. Sempre acontece.

Notei então uma garota um pouco à minha frente. Era jovem, 20 e poucos anos, e estava com a roupa que usaria na academia depois do banco. Os cabelos amarrados exibiam seu belo rosto, que seria apenas um bonito rosto se não houvesse nele o par de olhos castanhos claros que lá existiam. Parecia simpática, e minha hipótese fora confirmada quando puxou conversa com as pessoas próximas. Em grandes filas sempre acontecem conversas casuais sobre a demora no atendimento, o calor que está fazendo, o governo que nunca faz nada e sobre o que ele deveria fazer. Todo mundo sempre tem alguma solução. Curioso é que só o governo não a tenha.

Um funcionário do banco começava a distribuir senhas na tentativa de agilizar o atendimento. Iria demorar até eu receber a minha.

Ao contrário da velhinha simpática atrás de mim, a garota não a aparentava preocupação, nem mesmo pressa ou cara de poucos amigos. Teria que esforçar-se bastante para conseguir ter uma cara de poucos amigos. No intervalo de sua conversa casual, após passar as costas das mãos na testa suada, fixava o olhar em algum ponto no chão do banco lotado. Assumi que pensava no horário que sairia da academia a qual iria depois do banco. Se aqui demorar mais que o esperado terá que apressar-se nos exercícios. Talvez eu tenha sido ingênuo, afinal aquela garota de belo rosto poderia ter sim grandes preocupações. Talvez pensasse nas contas a pagar, nos trabalhos a entregar, no carro que tem que arrumar, na roupa suja acumulada e na torneira da pia da cozinha que não parava de pingar. Ainda poderia ela ter preocupações como as que a idade avançada traz. Entretanto não pude mais supor no que ela estaria pensando pois o funcionário do banco que tentava agilizar o atendimento havia acabado de me informar que “hoje o serviço que o senhor deseja está indisponível”.

Deixei o banco, que estava agora com o dobro do número de pessoas que havia quando cheguei. Enquanto caminhava, lembrava daquela velhinha simpática que a gente vê nos filmes de cinema e das suas preocupações. Lembrava ainda daquela jovem de 20 e poucos anos que iria mais tarde à academia. Elas e todas aquelas outras no banco com preocupações, atribulações, contas a pagar e coisas importantes a fazer. Ah, talvez aquela garota de olhos castanhos claros pensasse, quem sabe, em seu namorado!

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